segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Cartagena das Índias



                Cartagena das Índias é possivelmente a cidade mais encantadora do litoral caribenho da América do Sul. Fundada pelos espanhóis em 1533, em território hoje pertencente à Colômbia, foi mantida durante todo o seu domínio sob o estigma de ser o porto mais importante dentre todos os existentes em suas colônias. Por deter tamanha importância para a economia da coroa espanhola, foi sempre alvo de piratas e exércitos invasores das potências rivais. Dessa forma a cidade foi sistematicamente atacada, tanto por mar quanto por terra e acabou ganhando um eficiente e impressionante conjunto de muralhas e fortes. Estes baluartes da engenharia hispânica fizeram fama em todo o mundo e estão, hoje em dia, entre as mais belas estruturas militares do mundo. Durante o período dos movimentos libertários foi importante centro militar e base de Simon Bolívar que a apelidou de "La Heroica". 
                              

               Mas não são somente as obras de caráter bélico que fazem a fama da Heroica. Seu casario colonial, erguido em um tecido urbano que lembra o típico desenho de quadrícula espanhol, e mantido milagrosamente quase que intacto, somado ao maravilhoso clima e à natureza exuberante dos trópicos caribenhos  ajudam a propagar sua fama de belezas e encantos. Extremamente charmosa, a parte antiga e colonial, cercada pelas muralhas de pedra e conhecida como “Cidade Amuralhada” é capaz de conquistar o mais cético e introspectivo dos mortais. Suas estreitas e ensolaradas ruas exibem o melhor da arquitetura colombiana dos séculos de domínio europeu.


 Acima a bandeira do país hasteada no forte de São Filipe e abaixo parte da famosíssima muralha.

               Essa muralha não foi levantada toda de uma só vez, e sim em partes ao longo de muitos anos, chegando a ter, no ano de 1631 sua estrutura finalizada. Atualmente restam onze quilômetros de perímetro, dos quais oito em perfeito estado, que circulam quase toda a porção histórica. Desses 8 km (oito quilômetros) muito pouco foi perdido ou modificado, apresentando ainda hoje as características e proporções originais.


               Muito larga em determinados pontos (largura máxima de dez metros) e com altura que varia muito pouco (20 m.) é largamente utilizada pelos moradores e turistas como ponto de encontro e local para a prática de esportes e lazer. Dela pode-se avistar a cidade velha de cima, a cidade moderna ao fundo e a imensidão do mar aberto. Nos baluartes que apontam em direção ao oceano foram instalados bares e cafés que oferecem uma boa opção de entretenimento com uma bela vista. Reuniões em torno de um copo de bebida para ver o por do sol tornaram-se habituais tanto para os locais como para seus visitantes.


               O interessante é que a cidade convive muito bem com essa estrutura e não perdeu a  relação direta com o mar. Em outros bairros existem praias muito bonitas e apropriadas para o banho, mas ao redor da muralha  não existem pontos para o mergulho, onde os cartageneros praticam somente a pesca. Aterros levaram o mar um pouco além dos muros de pedra e uma larga via de acesso rápido foi projetada separando-a do mar. Essa estrada asfaltada que contorna o tecido viário mais antigo liga os bairros modernos do Sul e do Norte.


               Junto à muralha um belo gramado faz a moldura onde antes batiam as águas. Ao longo, vários pontos servem como local para um jogo de bola ou outra atividade esportiva qualquer. Ao fundo na fotografia a torre da Catedral aparece em destaque.


               Ao fundo o skyline do bairro de Bocagrande que repete a mesma receita das cidades modernas a beira mar: altíssimos edifícios de luxo perfilados ao logo de avenidas paralelas ao mar. O contraste é gigante a ponto de parecerem duas cidades distintas: de um lado temos a velha Cartagena Colonial com sua escala humana preservada e seu acolhedor ar de cidadela espanhola frente à cosmopolita e contemporânea Cartagena Moderna com suas linhas mais atuais e linguagem universal. Por causa dessa diferença na forma de propor a cidade, tanto na maneira como as relações humanas se manifestam como no padrão estético que responde pelo momento histórico, a diferença entre um bairro e outro se torna abissal. Em outras cidades litorâneas como o Rio de Janeiro, por exemplo, essa transição entre o velho e o novo não é tão repentina. Ao analisar o crescimento do Rio (é certo que o centro antigo foi muito destruído) podemos acompanhar e entender os momentos históricos com bastante clareza em um simples passeio de carro. Margeando a água fica mais claro: iniciando no centro antigo temos as construções coloniais misturadas com o ecletismo e a belle epoque carioca e a medida que vamos em direção ao sul vamos passando pelas várias praias e tendo uma história de arquitetura e urbanismo com sutil cronologia. Assim como os bairros passam, passam também os estilos e as décadas em clara ordem com um ou outro pontual exemplar de um estilo específico e totalmente diferente do contexto: Copacabana é bem anos 50 e 60, Ipanema 70 e 80, São Conrado 80 e 90 e a Barra é muito 2000! Mas aqui não! A ruptura é muito clara e muito em função da tão famosa muralha. Não há que se estabelecer parâmetros de avaliação entre tais cidades, basta entender como são. Não são nem melhores nem piores, são apenas diferentes.

Abaixo o Corralito de Piedra.


               Nessas duas fotografias aparece uma questão que convive com a modernidade: a poluição e seus efeitos nocivos sobre o patrimônio edificado. Com mais de 400 (quatrocentos) anos de existência o cinturão fortificado permanece impávido, mas não imune aos danos que se somam aos anos. 
               Com a chegada do automóvel e o aumento considerável da frota da cidade, surgiu um acúmulo de componentes químicos produzidos pelos escapamentos que enegrecem as rochas e penetram em suas ranhuras proporcionando o desenvolvimento de bactérias que causam o enfraquecimento, erosão e diminuição de sues volumes. Isso é motivo de grande preocupação para os órgãos de fiscalização e manutenção do acervo patrimonial da cidade. Essa crosta escura (que aparece muito bem na foto) tem que ser constantemente removida. Além de prejudicar esteticamente pode comprometer ao longo dos anos a integridade física da obra militar. Outra coisa: nada a ver o estacionamento de carros tão próximo ao monumento histórico!


               A Avenida Santander além de ser permanente foco de poluição do ar é também culpada pela constante vibração produzida principalmente pelos veículos de grande porte que cruzam a via a todo o momento.
               
Abaixo uma vista da bela torre da Catedral de Santa Catarina de Alexandria.


               A posterior torre sineira, de estilo eclético com clara influência francesa, da Catedral Metropolitana de Santa Catarina de Alexandria já iluminada no entardecer. Essa torre de cores pastéis, acoplada ao lado da espanhola nave de cor vibrante, domina o centro e é vista de vários pontos do bairro, já que seus edifícios, na maioria coloniais, raramente ultrapassam quatro andares. Posteriores são também os detalhes neoclássicos das menores portas laterais da fachada.


               Sua construção teve início em 1577 no mesmo lugar de outra antiga e modesta igrejinha de palha, sendo desse modo considerada como uma das mais antigas do novo mundo. Sua construção teve um involuntário atraso provocado pelo ataque do pirata inglês Sir Francis Drake no ano de 1586, sendo completada e consagrada somente em 1612. No início do século vinte o edifício sofreu uma alteração que decorou toda a fachada acompanhando o estilo da torre. Obras de restauro devolveram no que foi possível, a forma original, retirando todos os elementos decorativos de estuque e voltando a exibir os traços propostos pelo arquiteto Simon Gonzalez. No canto da esquina a ponta da enorme parede de padras aparentes.


               Essa igreja, implantada em um terreno de esquina, tem sua porta principal  aberta para a rua e uma lateral aberta para um calçadão que se conecta à praça Bolívar. A estrada secundária acaba concorrendo em importância com a abertura principal e cria um eixo perpendicular e transversal à circulação natural das três naves. A cúpula com lanterna da torre dos sinos, com seus tons róseos parece fora de contexto. Quem vê sua ornamentação e seu tratamento cromático não faz ideia do interior austero e limpo do silencioso e fresco interior.  





Acima a porta lateral da catedral.


               A vista exterior da hexagonal Capela Mor da Catedral com suas paredes facetadas. A nave central é mais longa que as duas laterais e permite uma fácil leitura externa do espaço interno que abriga o altar. O telhado mais baixo de onde brota a pequena e circular torre, faz o fechamento da nave direita do templo. Esse lado do edifício é voltado para a rua. Tais paredes de pedra se repetem na grande face lateral da igreja e eram também aparentes na torre e na fachada antes de receberem o reboco e os elementos que hoje a decoram. A modificação da face principal do prédio foi feita a título de uma renovação e readequação estética que ocorreu no início do século passado. Recentemente obras de restauro limparam o excesso de decoração e maneirismos  impostos ao templo mas não devolveram seu aspecto original. 


               Nessas fotografias aparecem diferentes ângulos da Praça Simón Bolívar. Na anterior é visto parte do antigo gradil que cercava completamente o passeio público. Assim como aqui no Brasil e em outras cidades do mundo o passeio público era em tempos antigos fechado durante a noite. Atualmente a praça que era antes totalmente cercada, possui seus quatro cantos abertos e a cerca outrora útil hoje possui apenas efeito decorativo.
                 Abaixo uma das fontes em meio ao canteiro e cercas vivas. A vegetação farta e luxuriante ameniza os efeitos do intenso calor e do sol forte e... o barulhinho da água... é tudo de bom!


               Os bancos são disputadíssimos e a concentração de vendedores e ambulantes é a maior da cidade. Mas nada  disso tira o encanto do lugar, bem pelo contrário: a agitação dá mais alegria.


               Sempre repleta de gente, a pracinha que leva o nome do militar venezuelano líder das campanhas libertadoras da América Espanhola, é ponto de partida ideal para um belo passeio a pé por entre as encantadoras e efervescentes ruas da cidade. Nas quatro calles que lhe fazem limite, estão vários edifícios importantes, dentre eles a catedral, o palácio do governo e o museu do ouro. Esse museu apresenta autênticos artefatos indígenas de rara beleza. Não é muito grande se comparado ao Museo Del Oro de Bogotá, mas mesmo assim é bem completo e muito interessante.


               A estátua equestre do libertador sob as frondosas copas de algumas árvores. Cartagena é uma cidade pobre em árvores e em praças com cobertura vegetal de alto porte. Esta é praticamente a única área verdadeiramente verde na área histórica. É um oásis de frescor no meio do conjunto de casas coloniais. Suas ruas também não exibem árvores ou canteiros públicos, que são compensados pelas enormes trepadeiras (geralmente buganvílias) que sobem pelas paredes das casas e exibem maciços floridos nas mais diversas cores. 


Mas nem tudo são flores na história desse importante porto. O maior exemplo disso foi o fato de que a cidade também sediou, no século dezessete, o Tribunal do Santo Ofício da Inquisição. A forte política dos padres católicos espanhóis estendeu seus braços para o Novo Mundo em 1610 e elegeu Cartagena como sendo sua sede.Abaixo o edifício sede desse tribunal abaixo da Linha do Equador.



               A belíssima, sólida, imponente e severa porta do antigo Palácio da Inquisição. O interessante nessa escultural entrada é a comparação que se pode estabelecer entre as proporções do edifício que a recebe e sua própria megalomania. Tomando toda a altura dos três pés direitos do prédio, esse portal barroco incrustado nas alvas paredes parece desconsiderar o que lhe tem em volta sem manifestar nenhum interesse em dialogar com as estruturas e peças de madeira. De qualquer forma não constitui nenhum problema ou defeito de caráter estético, mas tem em si a pretensão de ser o elemento mais importante da fachada. E não poderia ser diferente já que é a entrada principal do prédio religioso. 


Na única lateral do Edifício do Museu da Tortura vista da rua, o domínio das paredes brancas é notável. Suas   aberturas executadas em madeira escura (com exceção da porta de serviços) não dão a menor pista de que na fachada da praça (dobrando a esquina) existe o magnífico portal de estilo barroco. Os balcões, telhados com telhas de barro e as gaiolas de madeira torneada nos lembram que estamos em Cartagena. Atenção ao belíssimo coroamento da platibanda, que esconde o telhado colonial, executado em largo fresado que exibe uma série de ponteiras e de onde brotam várias calhas.


               A janela da delação. Por esta janela, aberta na lateral do edifício sede da Inquisição Espanhola, no centro da cidade antiga, eram entregues as denúncias, sempre de caráter anônimo, que acusavam os citadinos e visitantes de crimes cometidos contra a santa igreja católica. 


               Esta placa em mármore, fixada na parede bem próxima à janela, informa ao pedestre que passa o que ocorria nesse local. Um testemunho bárbaro das atrocidades que foram cometidas em nome da cruz. Essas informações antecipam o que pode ser visto dentro do prédio, que hoje abriga o museu da tortura. Seria um passeio totalmente dispensável se o prédio não fosse tão lindo por dentro. Infelizmente os autoritários atos de completa intransigência aconteceram mesmo e historicamente é muito importante que tenhamos este registro, entretanto, tenho lá minhas reservas em gastar o tempo vendo armas e instrumentos de tortura. Tem nos jardins uma guilhotina e uma forca onde os turistas tiram várias fotografias simulando sua própria morte. "?" Bizarro.


               Lá pelas tantas um alto relevo entalhado na pedra e engastado na alvenaria. Belíssima obra que retrata o Brasão de Armas do Príncipe das Astúrias. Outro registro histórico perpetuado nas paredes. Abaixo outra versão do mesmo brasão colhida na internet. É possível ver claramente na talha os detalhes e pormenores da figura abaixo. Muda o formato do brasão, mas as figuras, armas e detalhes são os mesmos. A coroa e o colar do Tosão de Ouro complementam o conjunto que apresenta ainda, em segundo plano, bandeiras, armas brancas e canhões evidenciando a vertente bélica e colonizadora da Corte.



               Acima a Igreja de Santo Domingo. Uma das mais importantes da cidade e localizada na praça que leva também o nome de Santo Domingo. De fachada muito austera, domina o sítio em que se encontra em razão de suas enormes paredes de cor alaranjada. Colada ao edifício do claustro (cuja entrada se dá pela porta ao lado direito) encerra um museu muito interessante. Sua composição é bastante pobre e se resume no portal esculpido em pedra clara e no enorme arco convexo. A pequena e atarracada torre parece ter perdido seu par que marcaria a esquina. 


               O arco pleno é mesmo muito legal e tem muita força. Indica o formato da cobertura que é composta por uma abóboda de canhão com revestimento aparente sem cobertura de telhas. O conjunto de pedra que abriga a porta principal parece ter sido esculpido diretamente na parede (lembra Petra) e infelizmente não exibe mais as imagens que no passado certamente estiveram em seus três nichos. O mais alto abaixo do óculo vazado provavelmente era ocupado pela imagem de seu santo padroeiro.
               Ela fica em uma das esquinas do cruzamento das calles Santo Domingo e dos Estribos. A Calle dos Estribos é considerada a mais estreita rua do centro antigo da cidade e deve esse título à própria igreja. Por problemas estruturais a nave do edifício ganhou enormes pilares de pedra externos com formato triangular (estribos ou botaréis chamados pelos locais de colchetes) que avançaram sobre a rua e diminuíram consideravelmente sua largura. Por causa dessas maciças estruturas a rua ganhou o nome que tem. O botaréu tem função clara de absorver o empuxo provocado pelo peso da cobertura, que pode provocar o colapso da parede externa que o sustenta, para mantê-la no lugar.


               A Calle de Los Estribos: a rua mais estreita de Cartagena. Os altos contrafortes comprometem totalmente a calçada lateral da igreja e oprimem o espaço externo. A rua é passagem obrigatória dos coches que carregam turistas que à essa altura são informados do pitoresco detalhe ao mesmo tempo que ouvem com maior clareza o trotar dos animais: por se tratar de uma via com as paredes das edificações muito próximas umas das outras o ruído natural da cidade é quase nulo e o efeito de funil potencializa o som provocado pelas ferraduras dos cavalos. 


               A planta baixa da igreja e do claustro. No desenho, já aparecem bem demarcados os estribos de sustentação da parede da esquerda (elevação da face sul), junto à rua, (em número de cinco). Estes reforços de seções diferentes, estão representados de forma bastante tímida, porque na verdade, por terem a base maior que o topo, eles invadem bem mais  a área pública. 


               Atrás das árvores aparece a longa e arcada cobertura da nave principal, feita de alvenaria de tijolos vermelhos maciços e revestida com reboco de superfície lisa. Na maquete vê-se a construção dessa abóbada de berço, onde aparece o cimbre que apoia os tijolos e é posteriormente removido. Essa longilínea cobertura semicilíndrica dá o formato do frontão da fachada e é dividida em seis partes determinadas pelo relevo dos arcos Torais. Também na maquete pode-se notar que a torre sineira não acompanha o esquadro determinado pela rua, obedecendo o esquadro interno do claustro (ver a planta baixa).



Acima a Gertrudes. 


Essa estátua em bronze de autoria do famoso escultor e pintor colombiano Fernando Botero é uma das grandes atrações da Cidade Amuralhada e ganhou o nome popular de Gertrudes. Simpático e muito apropriado, o apelido popular constitui-se na maior prova da aceitação geral pela escultura de proporções generosas e linhas arredondadas, batizada pelo próprio autor como Mulher Recostada. Sobre a figura da mulher nua, deitada languidamente em frente à igreja de Santo Domingo, na praça do mesmo nome, paira uma tradição muito simpática e ligeiramente profana: dizem que para voltar à cidade é preciso acariciar os seios da mulher. Convenhamos que é mais simpático passar a mão nos seios já bem polidos dessa escultura do que passar a mão nos “bagos” da estátua de touro da Wall Street em Nova Iorque (risos). Essa tradição já está incorporada no trajeto turístico local e torna o ato indispensável, assim como esfregar o cachorrinho na ponte Carlos em Praga, o focinho do javali no mercado de Florença, o homem deitado na entrada da Grand Place de Bruxelas, o pé da escultura na biblioteca tal, a caveira na escultura tal... e assim por diante nas mais variadas estátuas espalhadas pelo mundo. Sempre rodeado por muita festa o esfregar as mãos nos seios e mamilos da Gertrudes é prática obrigatória e muito divertida, potencializada pelo alvoroço contínuo da movimentadíssima praça ao lado. Existem outras versões sobre os poderes mágicos dos seios da Gertrudes. Os mais apaixonados, por exemplo, dizem que é bom para garantir a felicidade no amor. Seja como for, vale a pena.



Há quem não goste das linhas do autor. Eu particularmente adoro todas as suas esculturas e torço que em breve uma delas venha enfeitar uma praça no Brasil. Já tive a oportunidade de ver várias espalhadas por cidades das Américas do Sul, do Norte e Europa, todas sempre muito lindas. Gosto em especial de um cavalo na cidade de Santiago do Chile. No Brasil ainda desconheço se há alguma.
Os edifícios ao redor da praça repetem em sua maioria a cor das paredes da igreja. Isso causa uma sensação de unidade e cria um diferencial em relação ao restante dos logradouros do centro histórico.


               Acima a enorme arcada do mercado de Las Bóvedas. É uma estrutura que foi erguida unida à uma parte das muralhas da cidade. Os arcos voltam-se para o interior do sítio urbano (e cercado) de frente à um belo largo, enquanto que seus fundos ficam colados no paredão de pedras. Nesse ponto a cobertura de Las Bóvedas alargam o passeio sobre as muralhas que é alcançado por uma rampa lateral (eu, na foto estou na murada da rampa). Construída com fins militares, nada mais é, que uma sucessão de câmaras, posicionadas lado a lado, sem nenhuma abertura além da própria porta aberta para a arcada. Apesar de ter sido utilizada durante o período colonial como local de cárcere, foi concebida para suprir a falta de locais para armazenamento de mantimentos e paiol. Atualmente as antigas masmorras abrigam lojas de souvenires que vendem artigos locais para turistas. Esse conjunto de 23 celas data de 1796 e marca o fim da construção de grandes obras do período colonial. 


               O tema dominante da fachada desse edifício é o arco pleno, que em série, ainda que em uma única fileira junto ao chão, cria uma imagem tão forte que faz da sua enorme frontaria um dos principais cartões postais da região. É a única parte em que a muralha desaparece da paisagem e dá lugar a um corredor avarandado que protege as células enclausuradas das Bóvedas.


                 Acima uma foto em frente da estátua do fundador, Pedro de Heredia, na Plaza de Los Coches. A praça, cujo formato incomum de um triângulo escaleno, é o ponto onde ficam estacionadas as carruagens muito características, que circulam dentro dos limites da muralha e fazem a elegria dos turistas de noite e de dia. Nesse local existiu no pasado um mercado escravagista e foi também o pelourinho da cidade. Atualmente é conhecida como um ponto de venda de doces e produtos típicos do local.
               A praça em si é um grande calçadão com desenho geométrico de linhas brancas sobre fundo avermelhado que forma uma grelha regular. Totalmente seca tem quatro acessos, sendo três em cada um dos vértices e o quarto e principal sob os três arcos da torre do relógio. O desenho de grelha foi proposto tendo como base a parede da muralha com a torre, ordenando as linhas da paginação de forma paralela e perpendicular a esse lado. A auxência total de vegetação projeta as atenções diretamente sobre as construções quase sempre banhadas pelo sol dos trópicos.
               De um lado a parede lisa das muralhas com a torre do relógio bem ao centro e dos outros dois a beleza dos edifícios que possuem a mais encantadora arcada da cidade no pavimento térreo. Nas arcadas os vários bares, restaurantes e lojinhas são responsáveis pelo ponto mais agitado de toda a cidade.


                Os belos arcos dos diversos e coloridos edifícios na Plaza de los Coches. Essa arcada abriga uma série de estabelecimentos comerciais dirigidos ao divertimento e entretenimento adulto. Além das boites e casas de jogos existem também algumas famosas tavernas e casas de doces. Por causa de uma de suas docerias os arcos também são conhecidos como "Los Arcos Dulces". Evidenciada na foto a interessante visão da área da praça que afunila ao fundo em virtude do seu formato triangular.  


               A principal porta de entrada da cidade velha é essa sob a Torre do Relógio. Composta por três arcos, liga diretamente a região do Molhe dos Pégasus à Praça de Los Coches. Junto com Las Bóvedas são as duas únicas intervenções que modificam o corpo da alta murada. Mas cada qual a sua maneira: Las Bóvedas escondem totalmente a estrutura atrás de si, diferente da torre do relógio que incorpora e se funde à estrutura de pedras. Ambas recebem em suas paredes de alvenaria de tijolos reboco pintado de amarelo com detalhes em branco.


               A amarela torre do relógio com seus detalhes pintados de branco e ares de neogótico, incorporada à estrutura rústica de pedras da muralha que exibe nesse ponto um trabalhado portal neoclássico. Sobreposição de estilos e épocas.


A torre do relógio vista a partir das estátuas dos Pégasus, do lado de fora das muralhas.


               Este par de estátuas dos alados seres mitológicos não pode ser considerado um primor da escultura, mas certamente promovem um belo efeito visual e funcionam muito bem como pontos de referência e marcos visuais. Colocados lado a lado ao fundo do dique turístico fazem as vezes de anfitriões para os que chegam pelo mar. Relação meramente simbólica, uma vez que o porto fica um tanto distante. Mesmo assim voltados para a água cumprem com sua função lúdica. Penso que estas entidades importadas da mitologia grega poderiam dar lugar a outros personagens de maior importância para os cartageneros e com reais vínculos culturais com o povo colombiano. Ainda que guardem belas referências e que tenham boa aceitação no imaginário popular, estes Pégasus me parecem deslocados do  contexto e muito forçados. Destoam um pouco do autêntico e irrefutável clima que emana da cidade velha. Gostaria de ver em seus lugares personagens históricos locais ou do riquíssimo folclore da região. 


               Igreja de São Pedro Claver com sua pesada e austera frontaria do século dezoito, feita quase que inteiramente de pedras mantidas à mostra. O relógio recebe especial destaque por ter seu frontão rebocado e pintado, conferindo  um detalhe refinado que poderia comprometer a composição da fachada, mas que acaba não interferindo muito.  Por se tratar de um tímido frontão, apoiado em uma face retangular muito bem definida que hospeda a roseta, o efeito  do reboco pintado de amarelo produz um equilíbrio na hierarquia dos detalhes e seções que compõem o todo sem afetar a harmonia do conjunto.  



               Como uma boa representante da arquitetura jesuíta a igreja exibe sua mais que impressionante fachada de linhas barrocas. É a mais destacada igreja do centro da cidade velha.


               O belo rendilhado de pedra que contorna a linha interna do óculo, faz o vitral que retrata o santo Claver parecer mais interessante durante o dia e do lado externo, já que por motivos óbvios, não tira proveito dos efeitos da luz sobre o colorido dos vidros.



Teatro Heredia


               Teatro Heredia. Construído a partir de 1911 sobre as ruínas da antiga Iglesia de La Merced, foi durante muitos anos a principal casa de espetáculos da cidade até seu declínio na década de setenta e fechamento no ano de 1988. Permaneceu fechado por dez anos e reabriu em 1998 depois de uma criteriosa e caprichada restauração que devolveu para a sociedade um dos teatros mais graciosos das Américas.


                Com capacidade para cerca de oitocentas pessoas, o teatro não é dos maiores, mas é a síntese da cidade: acolhedor, simpático, charmoso e inesquecível. Nada nele tem a pretensão da opulência ou ostentação. O fausto fica para as obras que nele são encenadas. 


O teto da platéia é obra do famoso e consagrado artista colombiano Enrique Grau.



               A belíssima cortina de boca de cena, também pintada por Grau, exibe vários dos monumentos da cidade, fazendo fundo a uma mão que empunha um muito emblemático ramalhete de flores. Ao centro do frontão acima do palco, uma estátua da Índia Catalina. Esta índia é um dos personagens históricos mais conhecidos do país e dá nome ao troféu do Festival de Cinema de Cartagena.


               Na cortina, retratados também o mar do caribe e a grande rosa vermelha, mais famoso produto de exportação da Colômbia.

               A alternância entre os tons de madeira e o branco produz um resultado plástico maravilhoso e muito sofisticado. Essa dinâmica entre os dois tons predominantes e as superfícies vazadas cria um ambiente requintado com ricos efeitos de fundo e figura. 


               Depois de restaurada a sala de espetáculos foi convertida em um dos principais palcos do Festival Internacional de Música de Cartagena. Seu trabalho em madeira é digno de nota e produz um efeito cênico de grande beleza. Os muitos painéis de madeira rendilhada assumem diversas funções  como divisórias, balaustradas, biombos e portas que permitem a passagem do som causando pouquíssima reverberação. É também uma solução inteligente para um edifício de cidade de clima quente e úmido, pois permite a livre circulação de ar e facilita a refrigeração artificial. Os materiais de texturas lisas e acabamentos envernizados são compensados pela riqueza do estofamento em veludo vermelho das cadeiras e poltronas que compõem a platéia, frisas e demais camarotes.


               Na foto abaixo, é possível perceber o efeito de filigrana que os painéis de madeira recortada produzem e o conjunto agradável e peculiar que resulta. Os entalhes colocados no centro das almofadas de varetas brancas parecem flutuar e as divisórias entre os diversos camarotes são extremamente leves. Um  bom local para ver e ser visto.








               Na fotografia anterior uma vista interna da Fortaleza de San Filipe de Bajaras. Esta monumental estrutura levantada em trinta anos com tijolos e pedra é o maior forte espanhol no Hemisfério Sul. Imenso, ele se funde com a colina de San Lazaro e atinge uma altura formidável para uma edificação dessa natureza. É também considerado como uma das maiores estruturas erguidas em território colombiano e foi em 1984 declarado patrimônio da humanidade pela UNESCO. 


Acima uma visão da sofisticada fachada do Palácio do Governo e abaixo um detalhe de suas belas luminárias. 











               Riquíssima em claustros e em pátios internos Cartagena oferece ao seu morador e seus visitantes espaços generosos para o descanso e para a contemplação. A grande maioria de edifícios públicos se ordena ao redor de um grande pátio central aberto e cercado por duas ou mais fileiras de arcadas.






Cartagena das Índias e seu casario:

       

               A Cartagena amuralhada é composta por quatro pequeninos bairros assim denominados: Centro, San Diego, La Matuna e Getsemani. Muito parecidos entre si, quase se confundem, mantendo muito próximas suas características e ritmo de vida. Entretanto, com um olhar mais atento, é possível perceber a mudança na estrutura e nas características das residências e nos prédios públicos ou comerciais de cada um deles, quer pelo estilo ou quer pela época. No Centro (o mais interessante) estão os edifícios da administração pública, principais igrejas e museus, o teatro municipal, a biblioteca, os hotéis mais sofisticados e sua maior universidade. Já nos outros três, encontramos os mercados públicos, as ruínas da antiga arena de touros, igrejas menores, o ajardinado passeio público, outras instituições de ensino e pelo menos mais três importantes teatros, inclusive o do moderno centro de convenções.



                 As fachadas quase sempre adotam um desenho simétrico no posicionamento de suas portas e janelas. Na casa da fotografia acima essa preocupação resultou em uma das mais belas e harmônicas, onde todos os elementos arquitetônicos garantem seu destaque. O pé direito duplo da entrada principal marcado pelo alto batente de pedra de lastro, ladeado por duas lanternas que a separam dos graciosos  balcões, somados ao comprido balcão superior que segura o telhado e se projeta sobre a calçada formam um exemplo formidável de casa de uma família de classe alta. Na casa ao fundo mais uma bela variação no uso das cores: paredes brancas com madeirame verde escuro.


                Muito comum pelas ruas da cidade velha, estas lindas janelas protegidas por uma espécie de muxarabi, onde as treliças dão lugar às torneadas varetas de madeira, valorizam e dinamizam as fachadas das casas: clara releitura da influência árabe. Este tipo de janela projetada sobre a rua com base de madeira ou pedra sustentada por cachorros, também é conhecida como janela do tipo púlpito. Maneira inteligente de garantir privacidade e ventilação para ambientes tão próximos à rua.




               Os balcões sustentados por portentosos cachorros de madeira exibem com garbo e graça as maravilhosas trepadeiras que brotam de pequenos buracos feitos nas calçadas e sobem pelas paredes até atingirem o volume e as proporções desejadas.   


               Em uma das movimentadas ruas comerciais do Bairro do Centro as altas casas com suas varandas amadeiradas se mesclam com edifícios ecléticos de épocas mais recentes. Geralmente os edifícios mais altos e mais novos possuem uma decoração que reflete o gosto do final do século dezenove e início do século vinte. Intervenções que representem as décadas de 1930 em diante são raríssimas.


               As paredes das casas podem variar muito de cores, exibindo desde o mais alvo dos brancos até os mais quentes tons de amarelo e alaranjado. Geralmente as casas com cores mais berrantes optam pelo acabamento em branco nas suas peças de madeira. 


Apesar da grande perspectiva uma coisa é certa: as ruas sempre acabam na muralha.


               Apesar dos belos contrastes das coloridas fachadas da parte antiga, as que mais me agradaram foram justamente as totalmente brancas. Todos os edifícios caiados ou pintados inteiramente de branco passam um ar mais caribenho e remetem diretamente ao clima praiano da região. Além disso nos dias ensolarados e sem nenhuma nuvem, o fundo do mais azul dos céus juntamente com o tom forte das trepadeiras criam um cenário de cine "cult". É certo que se trata de uma visão estereotipada do Caribe, mas nesse caso posso garantir que a sensação passa longe do preconceito e do ar pejorativo. É pena que a vida não tem trilha sonora porque se tivesse essa cidade viveria em uma festa permanente nas vinte e quatro horas do seu dia e o turista pensaria estar dentro de um filme romântico da década de cinqüenta.





               As casas de Cartagena, na sua totalidade, obedecem a um mesmo padrão de ocupação do solo, com suas testadas junto ao passeio público e coladas em suas duas estremas laterais. Geralmente dotadas de um pátio interno central, podem ter ou não um quintal aos fundos. Seus andares variam entre casas térreas ou sobrados de dois ou três andares. Os edifícios que ultrapassam os três andares são em sua grande maioria os de caráter público.


               As casas de três andares pertenciam aos muito ricos, as de dois andares eram as construídas pela classe alta e as térreas pelos remediados e menos afortunados. Os mais abastados preferiam construir suas casas no Centro próximas aos principais edifícios públicos, deixando os três outros bairros para as classes mais baixas.
               Na fotografia anterior temos exemplos de casas de dois e um andares em uma rua de transição entre os bairros do Centro e de San Diego.


                  Amarelo, rosa e branco nas paredes. Branco, marrom e verde água nas aberturas: cores e mais cores em um jogo interminável de combinações. As grandes trepadeiras, as belas lanternas, muitas telhas de barro do tipo capa e canal e a luz fenomenal dos trópicos evidenciam o ar caribenho da cidade.


Não é só em Nova Iorque que um arquiteto embasbacado anda o tempo todo olhando para cima! (risos)



Vez por outra uma lembrança da arquitetura "cajun" de New Orleans.