quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Simmons Hall Residence Building

Logomarca do Simmons Hall


Arquitetos: Steven Holl e Tim Bade.
Engenheiro estrutural: Simpson Gumpertz & Heger.
Local: Cambridge, MA, USA
Cliente: Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT).
Função: dormitório estudantil para a graduação.
Ano: 1999-2002.
Número de Pavimentos: 10.
Estrutura: concreto armado.
Revestimento: alumínio.
Apelido: "The Sponge".

Prêmios nos EUA:
  1. Progressive Architecture Awards/ 2000
  2. NY AIA Design Awards/ 2002
  3. National AIA Design Award/ 2003
  4. Best of Boston New Building Awards/ 2003
  5. Boston Designe Awards - Medalha Charles H. Parker/ 2003
  6. ACEC Honor Award/ 2004


               Mesmo sendo um profissional de primeira linha, não deve ter sido nada fácil para Steven Holl projetar esse edifício a pedido do Instituto de Tecnologia de Massachusetts. Em primeiro lugar pelas proporções do lote em relação à função do próprio prédio: um edifício-moradia para mais de três centenas de estudantes da graduação da instituição que deveria ser erguido em um estreita faixa de terra com largura de 250m e profundidade de apenas 28m. E em segundo pelo fato de ter logo em frente o célebre e icônico edifício projetado por Alvar Aalto para a mesma instituição e com a mesma função: O sinuoso Baker House de 1948 (um dos únicos dois edifícios do finlandês na América do Norte) situado nas margens do Rio Charles de frente para o skyline de Boston.

               Formado em arquitetura pela Universidade de Washington em Seattle, rumou na década de setenta para a Europa onde aprimorou seus estudos na cidade de Roma e pós-graduou-se na conceituadíssima Association School of Architecture (AA) em Londres, no ano de 1976. De volta ao seu país, iniciou sua carreira na Califórnia, mas mudou-se rápido para a cidade de New York onde passou a desenvolver vários trabalhos que lhe renderam inúmeros prêmios. 


          Como o terreno era marcadamente retangular, com uma testada muito longa junto ao passeio e voltado para o campo de esportes, o principal receio era criar um edifício com uma massa muito grande e pesada. Para evitar a construção de um bloco muito longo e totalmente compacto que formasse uma verdadeira barreira à paisagem e fechasse totalmente a perspectiva da área, Holl bolou um prédio cujo corpo possuísse enormes recortes que lembrasse o skyline de um cidade ao invés de um enorme e opressor muro. Pois bem, dessa maneira recortou o volume em todas as suas arestas e abriu canais de ventilação que permitem não somente a passagem de ar como de luz. 
           Ainda que tenha sido concebido com essa maleabilidade de formas, suas linhas se mantiveram muito duras. Muito grande, esse prédio de quase duzentos mil metros quadrados de área construída, abriga um total de 350 unidades autônomas, individuais ou compartilhadas, que podem servir tanto ao corpo discente como ao docente, além de um pequeno teatro com capacidade para 150 pessoas, academia, laboratório de fotografia, salão de jogos, centro de informática, lounges para estudo e convivência, refeitório, bar e até uma piscina de bolinhas!

            Sua forma externa ainda que muito monolítica, brinca com esses recortes em seu volume e cria passagens que ligam sua frente à parte posterior do terreno como no caso da portaria. Nessa foto é possível ver como é proporcionalmente muito estreito o terreno.


               Essa forma de volumes cúbicos, ora sobrepostos, ora cavados se repete na belíssima grelha que o reveste inteiramente. Nela também surgem algumas formas arredondadas que ao meu ver restam perdidas na composição estética. O recurso de recortar e esculpir o corpo do prédio funcionou muito bem mas, certamente as aberturas maiores com linhas arredondadas ficaram totalmente perdidas e sem propósito. Esses grandes buracos na pele foi um erro imenso! Muito feios e muito mal colocados, perturbam o observador e causam uma ruptura ao belíssimo ritmo imposto pela grelha. Os recortes na volumetria do prédio já bastavam, assim como os aleatórios favos preenchidos pela estrutura (e dessa forma sem janelas) que pontuam toda a fachada. O arquiteto infelizmente não soube o momento de parar...


               Acima um detalhe das formas orgânicas erroneamente repetidas na marquise. Como se já não fosse infeliz o bastante as formas quase amebóides estragarem as elevações, elas aparecem novamente para comprometer o que poderia ser uma bela prancha em balanço. E não me venham com desculpas! Esses buracos só estragam! Nada a ver! É notório que regras foram feitas para serem quebradas, principalmente quando se trata de arquitetura, entretanto, saber a hora certa de ir contra essas regras é uma arte! Aqui isso não se manifesta positivamente. Me lembram aquelas infelizes (que me desculpem meus antigos professores) e também horrendas janelinhas amebóides do SESC Pompéia, feitas por Lina Bo Bardi. Infelizmente o erro se repete! E aqui amplificado! Esses buracos disformes são a receita certa de como estragar uma fachada!



            Por causa de sua grelha uniforme ele recebeu o apelido de Esponja. Na verdade quem deu o apelido foi seu próprio projetista que teria se inspirado em uma esponja de banho. Naturalmente que deve ter sido um macio paralelepípedo esburacado, ou seja, uma esponja industrializada! Não deve ter sido, como dizem os mais românticos, uma esponja marinha a fonte de inspiração para o arquiteto! Convenhamos, isso é a industrializada América! (risos) Só não me venham com balela tentando dar ao prédio um ar organicista que na verdade ele não tem! Internamente os recursos adotados para dar movimento e suas linhas orgânicas e onduladas também não deram certo. Ficaram perdidas por terem sido mal concebidas, e feias por terem sido muito mal executadas e acabadas.
                Botando a ácida crítica de lado, o apelido é mesmo bem pertinente. Pelo lado filosófico essa esponja é entendida como um corpo poroso capaz de absorver e manter aquilo que provém do mundo ao seu redor. Retém tudo o que possa ser extraído do universo em que está inserido, captando cultura, atualidades, comportamento, estudos e experiências mil. Depois de entendida essa gama de informações, devolve todo o conhecimento acumulado por meio de seus graduados. É como encher e esvaziar uma esponja. Enche para tornar viável sua função, depois esvazia no processo de uso, para retornar a encher! Cria ciclos, como a troca de pessoas que entram como estudantes e depois saem já formados. Linda a ideia!


               A cada andar correspondem três fileiras de janelas. Vez por outra aparece uma janela maior que absorve quatro pequenos vãos. Essas janelas maiores se comportam muito bem, ao contrário daquelas terríveis amebóides! Nesses pontos acontecem várias atividades distintas da função de moradia. O prédio é mesmo muito dinâmico internamente, criando ambientes dos mais variados, introduzidos de forma aleatória entre os tantos dormitórios. Isso produz um movimento interno mais espontâneo e livre. É como uma cidade dentro da cidade, onde cada ala do prédio se comporta como um bairro diferente e original. Seus próprios recortes acentuam essa característica. Os três volumes superiores separados pelos recuos, por exemplo, se comportam como alas autônomas e independentes.   




               O exoesqueleto, em concreto armado revestido com placas de alumínio fosco, exibe um enormidade de pequenas janelas quadradas. Esse esqueleto portante é bastante largo e os caixilhos das janelas são fixados bem recuados, mantendo toda a espessura da parede voltada ao exterior. Internamente (como mostra a foto abaixo) elas se mantém retas. Nos dormitórios, o conjunto de janelas recebe um número fixo de nove, onde todas podem ser abertas.  





               

               Quando terminado custou aos cofres do MIT quase oitenta milhões de dólares o que o tornou o edifício de dormitórios mais caro do Instituto desde o prédio de tijolinhos projetado por Aalto. 


              

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Isabella Stewart Gardner Museum

               Isabella Stewart Gardner foi mais uma daquelas figuras milionárias norte-americanas que legou ao Estado uma suntuosa coleção de artes. Tida como uma das mais proeminentes figuras femininas da filantropia em todos os tempos, destinou seu tempo e dinheiro para reunir sob o mesmo teto uma invejável coleção que inclui desenhos, pinturas, mobiliário, artefatos de várias culturas antigas, tapeçarias, vidros e muitos outros itens de inestimável valor. Em seu testamento ordenou que nada fosse mudado no museu, que deveria obrigatoriamente respeitar a ordem e a distribuição das peças feita pessoalmente. Legou, ao povo de sua cidade e país, além do conjunto que originou o museu, uma alta soma em dinheiro para servir de base à manutenção desse patrimônio, além de destinar altas quantias para ajudar no combate e prevenção aos maus tratos contra crianças e animais.  
                  

Isabella em retrato assinado por John Singer Sargent

               Muito culta, aproximou-se de intelectuais e artistas e passou a patrociná-los. Viajou o mundo todo em busca de objetos e percorreu grande parte da Europa, Ásia e do Oriente Médio coletando peças das mais diferentes origens e estilos. Depois de viúva e já detentora de uma considerável quantidade de obras de altíssimo valor, mandou levantar um casarão em estilo medieval tardio italiano, somente para expor seu vasto acervo. Para isso contratou Willard T. Sears (profissional que transitava entre os estilos neo-gótico e neo-renascentista) que aceitou a encomenda e desenvolveu o projeto sob a ótica e as autoritárias exigências da cliente. Gardner acompanhou pessoalmente todos os estágios da obra para garantir que o estilo adotado pelo partido arquitetônico refletisse sua paixão pela cidade de Veneza: seu destino favorito fora da América.


               A ilustração anterior mostra uma vista do casarão de quatro andares construído especialmente para receber a coleção Gardner. Consta que esse prédio foi o primeiro a ter um vão central coberto por vidros fixos em uma estrutura de aço nos Estados Unidos da América. É na verdade um prédio moderno com estrutura de betão armado e lajes de concreto revestidas com pisos e outros materiais desenvolvidos especialmente para seus interiores. Vários fragmentos e peças trazidas da Europa central foram adicionadas ao corpo do edifício para garantir a atmosfera pretendida.
             No cartão postal aparece a cumeeira em vidro que representa exatamente o vão central coberto. Por fora o prédio não é bonito e nem mesmo atraente, exibindo uma fachada muito simples, monótona e bruta. De forma avessa, seu interior já é bastante dramático e variado, o que o torna muito interessante. Quanto à beleza, bem, daí é uma questão pessoal.


               Na virada do século a administração do museu chegou à conclusão que suas instalações já não comportavam mais a crescente demanda e procura por parte da população citadina. Várias atividades que vinham sendo oferecidas à comunidade mereciam novos e mais modernos espaços. O museu que ao longo dos anos ampliara sua relação com a cidade, precisava de uma estrutura capaz de levar a cabo toda a agenda cultural imposta. Para isso a velha e abarrotada casa de Isabella não dispunha de áreas livres o suficiente.
                   Em 2004 o arquiteto italiano (já premiado pelo Pritzker) Renzo Piano foi contratado para projetar as novas e moderníssimas alas do ISG Museum. Depois de muitos anos gastos entre projetos e análises o resultado foi o bacana prédio abaixo:


               Com um custo final que superou os cem milhões de dólares o prédio de Piano é uma ode ao bom gosto. Com muito vidro e metal revestindo seus volumes bem ordenados e bem proporcionados, dialoga com a casa ao lado de forma a garantir uma independência de linhas a ambos. A altura final de sua cobertura e suas linhas retas respeitam as proporções e escala da casa primeira.
                   A cobertura com pé-direito generoso, locada à frente da fachada que ganha o mural decorativo, é o corpo da bilheteria. Muito bem colocada, atrai com eficiência o visitante que reconhece nessa área a porta principal do museu. Parece besteira apontar para esse tipo de coisa, mas não são poucos os novos projetos que não marcam de maneira clara os seus acessos, impingindo ao pobre visitante o dissabor de dar voltas e mais voltas até achar por onde entrar! (risos)
                  O painel colocado sobre a parte vedada do corpo mais alto do museu (aqui com uma arte em tons de rosa) é outro detalhe que adorei. Muito bem colocado. Quando expostos os cartazes das mostras ou qualquer outro acontecimento da programação cultural, o painel cumpre com sua função e não atrapalha a fachada como acontece em outros museus ao redor do mundo que desfraldam seus enormes banners e geralmente tapam a beleza de suas frontarias. Quando não está acontecendo nenhuma atividade o painel vira uma obra de arte que embeleza e enche de cor a área.  


               Adoro a diferença de cores que existe entre as várias partes componentes do revestimento do prédio. As placas exibem uma variada palheta de verdes que cria um dinâmico mosaico, que em dias de muito sol servem de tela para o desenho das sombras projetadas  sobre a fachada. 


               As escadas abertas à paisagem, além de muito bonitas, fazem uma clara referência às típicas escadas de incêndio dos grandes centros urbanos norte-americanos. As portas de acesso para cada um dos andares são bem grandes e rodeadas por vitrôs que transformam os patamares em balcões voltados para a vista da cidade.

     
                Gosto muito dos vigotes de metal dos quais partem cabos que ajudam a estruturar a pele de fora da fachada. Eles ainda conferem muito movimento ao que seria um simples cubo esverdeado. Aliás, o tom verde claro dos vidros e o cinza dos elementos metálicos me agradam totalmente.
               


               A perspectiva do prédio é muito enfática! A altura da parede inclinada parece ainda maior do que realmente é. Isso se deve porque a linha da platibanda se afasta do observador e se eleva a uma altura suficiente para tapar os edifícios mais altos dos quarteirões vizinhos.


               A linha verde que se vê no alto entre as duas últimas divisões do caixilho é na verdade um toldo retrátil subdividido por cada janela. Como nesse dia o tempo estava ótimo, com temperatura de meia-estação, os toldos individuais estavam todos recolhidos. Quando abertos cobrem os panos de vidro e exibem uma coloração bem forte. O verde muito cítrico dá um toque de cor à fachada que agrada.



               Além de criar um belo detalhamento de fachada o tratamento dado à suas paredes (alternando seus vidros com todos esses elementos metálicos) confere um efeito cênico extraordinário. Todas essas grelhas, grades, brises, pérgulas, cabos, escadas dão um aspecto moderno ao prédio que tira proveito dessa composição metálica (tanto interna como externa) para garantir uma higiene habitacional de elevado padrão. Todos esses componentes arquitetônicos guardam também uma função que vai além do efeito estético conferindo uma versatilidade ímpar para garantir um bom equilíbrio térmico interno. A luz natural que entra é bem controlada, assim como a circulação de ar cruzada. Em uma cidade com enormes diferenças de temperatura, um edifício que seja capaz de controlar sua temperatura interna representa uma economia fantástica de energia, pois dispensa o controle artificial de temperatura.


               A versatilidade dos vários módulos que compõem a fachada, se revela muito inteligente e eficaz, garantindo uma boa relação entre o espaço construído interno e o mundo à sua volta. O uso dos recursos naturais para garantir um bom microclima interno é a tônica aqui, sem contudo deixar de entender a total ou parcial permeabilidade visual das partes de convívio, visitação, administração e serviços.





               A estufa vista da sala da bilheteria. Ela ocupa uma área bastante grande da fachada que tem em sua parede inclinada seu maior atrativo. Linda por dentro e por fora serve não somente como fornecedora de plantas para os jardins do museu (um luxo!) como barreira visual entre o exterior e o interior da parte de serviços do prédio. É de um apelo visual fantástico e eleva a porção menos valorizada do conjunto ao mesmo patamar de requinte e sofisticação encontrado em suas áreas mais importantes.


               Ocupando quase todo o quarteirão os dois prédios do museu dominam três de suas quatro esquinas. A casa antiga é voltada para uma das mais importantes ruas do bairro, enquanto que a estrutura mais nova tem sua fachada principal  voltada inteiramente para a praça à sua frente. A casa de 1903 está marcada com a letra A. O edifício de 2012 está dividido entre as letras B e C, onde B é reservado às novas instalações do museu e C é a parte da estufa com cômodos para serviços.
  1. Jardim da casa projetada por Sears;
  2. Jardim do prédio de Piano;
  3. Entrada do museu pela nova ala;
  4. Lounge;
  5. Loja;
  6. Cafeteria;
  7. Restaurante;
  8. Vão central da casa em linhas venezianas e coberto com estrutura de aço e vidros.
               A letra B está locada no hall de distribuição vertical em cima dos elevadores. Nesse hall está a grande escadaria que se alinha com o corredor que dá acesso à estrutura de época onde está exposto todo o acervo. Esse acesso é dado por meio de um corredor de vidro que no desenho aparece tampado por dois maciços de vegetação. A circulação principal é iniciada no número 3 (logo após a bilheteria que fica ao lado da estufa), passa pelo B a vira em direção ao casarão, acabando no 8. Depois o visitante passa a percorrer todos os aposentos da casa principal, ganhando três dos quatro andares existentes e depois descendo para a nova estrutura, seguindo uma ordem imposta pelo próprio museu que pode ser alterada a qualquer tempo.


Antes um desenho da fachada do conjunto de novas alas ao lado do antigo casarão.


               Acima a feia fachada do museu de Gardner. A coluna de chaminés que se bifurca é pavorosa! Suas esquadrias estão mais para um prédio de indústria fabril do que para um palácio veneziano e a porta principal é muito acanhada. Quem vê por fora imagina que tantas e tão altas janelas propiciam ambientes claros, arejados e aquecidos pela luz solar ao interior, no entanto o que acontece é exatamente o inverso. Os ambientes são muito escuros e frios. Para quem circula por entre seus mais diversos cômodos, a vista das praças ao redor é praticamente inexistente e o contato entre interior e exterior é quase nulo. Isso faz voltar todas as atenções para o grande átrio interno.


                  O largo e alto vão central coberto, reproduz um palazzo gótico italiano. Possivelmente inspirado no Palácio Barbaro, um dos mais belos do Grande Canal de Veneza.
              No centro desse impressionante jardim interno foi colocado um mosaico romano que é visto de qualquer ponto da loggia térrea e de todas as janelas dos andares superiores. Nele estão também dispostas muitas estátuas e fragmentos da era clássica. Suas paredes ganharam um tratamento de estuque veneziano que faz um belo fundo à vegetação luxuriante.
              O enorme conjunto de colunas originais, distribuídas de forma ordenada e espelhada nos quatro andares (que vieram de diferentes prédios medievais europeus) faz o menos informado visitante acreditar que a exemplo de outras façanhas do emergente país, se trata de uma edificação de época trazida inteiramente da Itália. Mas não! Os artefatos e as peças isoladas são mesmo frutos do mercado de artes do final do século dezenove e início do vinte, mas o prédio tem mesmo DNA americano. Outrossim, é a única parte de real beleza de toda a construção. Ainda bem que a maioria dos feios e sufocantes interiores se abrem para esse iluminado e fresco vão. Pelo prédio em si não se tem muita vontade de continuar a visita mas, sim, ficar virado e debruçado em uma das balaustradas trazidas do velho continente.


               Apesar de aclamado como um espetacular museu de artes e como um dos principais de Boston sua parte antiga não me impressionou em nada. Talvez (por expressa vontade de sua doadora) pelo fato das peças terem sido mantidas exatamente no mesmo local onde foram por Isabella dispostas, ao tempo de sua inauguração e durante sua vida. O museu é muito problemático e ruim de ser visitado. Ruim é pouco: é péssimo! Atrapalhado, agoniado, escuro, mal orientado e tudo o mais de ruim que pode ser atribuído a um museu. Uma pena pois tem obras magníficas como um auto retrato de Rembrandt, ainda jovem, muito mal iluminado.  


               A casa é muito escura e muito soturna, tal qual um palácio de 600 anos atrás, encravado entre os canais da italiana cidade dos Doges. Mas, rodeada pelas praças de Boston torna-se perdida e sem graça, ainda que seja a realização de um sonho da classe alta yankee. O gosto da antiga dona, pode não encontrar eco nas novas gerações abençoadas por toda a parafernália moderna, mas certamente causou frisson no ceio dos barões, políticos e acadêmicos da mais aristocrática cidade norte-americana.

               Atualmente é quase um martírio tentar entender o que está pendurado em suas paredes. A iluminação é péssima e a aleatória forma como as obras se encontram não é nada suavizada com recursos simples ao alcance da curadoria. Nada de placas nem letreiros. O material impresso é pobre e deficiente e a comunicação visual antiquada ou nula. O visitante fica refém daqueles infernais aparelhos de áudio ou de disputadíssimos displays plastificados contendo um desenho do lay-out de cada uma das paredes com suas respectivas legendas! Um inferno. Desanimador. Depois da quarta sala o desinteresse é geral. 


             Os quadros que aparecem na fotografia anterior, apenas com suas molduras, servem de testemunho ao maior roubo de artes que ocorreu em um museu privado em todos os tempos. Em 1990 foram levadas inúmeras relíquias como a Tempestade no Mar da Galiléia de Rembrandt, única paisagem marinha conhecida do famoso holandês. Por causa das determinações do testamento as molduras não podem sair de onde estão e permanecem à espera da volta de seus valiosíssimos recheios! Foram-se várias obras de Rembrandt, um Veermer, um Manet, dentre outros, resultando em um prejuízo de cerca de U$ 500 Mi. 


               Exemplo de um acervo fantástico que não explora nem um décimo de seu potencial. Há quem diga que suas instalações são agradáveis como o interior de uma casa senhorial e que reproduz à perfeição como a milionária vivia em seus domínios domésticos. Descabida a comparação visto que o prédio foi criado como um museu e que os aposentos privativos de Isabella ficam no quarto e último andar, inacessível ao público. Seja como for, infelizmente ainda é um museu para ir uma vez na vida e nunca mais voltar.


Outro retrato de Isabella Stewart Gardner, também exposto permanentemente. Esse pintado por Anders Zorn.


  Diferente do conteúdo que exibe, a velha casa que sedia o museu é muito feia mesmo:

1) Seus pisos são irregulares e descontinuados, seguindo o preciosismo da reprodução de época;
2) Suas paredes ganham tons e texturas de gosto duvidoso ao exemplo das piores da antiga Itália;
3) Sua iluminação é precária e a circulação de ar deficiente (talvez motivadas pelo rigoroso inverno da região);
4) Suas obras de arte se acumulam de forma desordenada e mal exposta (talvez pela enormidade do acervo);


          Já a parte moderna, edificada imediatamente ao lado, é tudo de bom! Linda e atemporal, clara e arejada, moderna e eficientemente confortável, serve de real contraponto à estrutura levantada pela rica Isabella. Não poderia ser diferente: muito dinheiro gasto com alta tecnologia e design de categoria...


Muito interessante o contraste entre as duas edificações, evidenciado nesta vista da casa de época a partir do interior do moderníssimo anexo de Piano. 


A proliferação de metal e vidros cria um prédio com muitos reflexos e golpes visuais.
Iluminação sofisticada e de efeito...



          É importantíssimo salientar que minhas opiniões (tantos as positivas com as negativas) podem não refletir a opinião que prevalece, portanto, a visita ao museu deve ser considerada indispensável para quem vai para Boston. A despeito de tudo que se diga, uma certeza existe: seu acervo é mesmo imperdível e incalculável e a gratidão à filantropia de sua criadora é imensa!
         Desejo que todas as obras de arte roubadas de seus interiores sejam, um dia, reintegradas ao conjunto deixado por Gardner e possam voltar a fazer parte da exposição permanente.

terça-feira, 5 de agosto de 2014

MIT Chapel em Cambridge / Massachusetts


          A Capela Kresge, ou simplesmente a Capela do MIT (Massachusetts Institute of Technology), foi projetada na década de cinqüenta pelo famoso arquiteto finlandês naturalizado norte-americano Eero Saarinen (1910-1961).
          Está localizada no Campus do MIT, em local de grande destaque e importância, tanto para as instalações do Instituto quanto para a cidade de Cambridge, que o acolhe. Esta cidade é vizinha de Boston da qual é separada pelo rio Charles. Cambridge é o lar de duas das mais respeitadas instituições de ensino dos Estados Unidos da América: o próprio MIT e Harvard.


          A muito tempo eu desejava conhecer esta pequena capela por considerá-la muito interessante e original e também por se tratar de uma das pouquíssimas obras arquitetônicas de Eero que tinha conhecimento. Confesso que ainda hoje não conheço muito de sua obra além dos clássicos como o incrível terminal da antiga empresa TWA no Aeroporto JFK (1962), a Miller House (1957), o sensacional David Ingalls Rink (1958) e do impressionante Gateway Arch de Saint Louis no Missouri (1947).


          Capela é um templo cristão secundário, com o objetivo de atender a um grupo específico e menor por meio de uma construção mais próxima ou um apêndice integrado a outra de função distinta como um hospital ou um colégio. O termo secundário se aplica pela hierarquia existente entre os diversos edifícios de cunho religioso onde a Catedral é o edifício principal de uma diocese, a igreja o templo primeiro de uma paróquia e a capela é a igreja menor sem culto diário. Existem ainda as Basílicas, Basílicas Menores e as Abadias. Se a capela estiver em lugar ermo pode ganhar a denominação de Ermida.
          Saarinen projetou um pequeno templo cristão para o MIT em um corpo próprio e independente de qualquer outra estrutura pré existente. Adotou a forma cilíndrica e escolheu um material muito aceito pela comunidade  e já usado em larga escala nos prédios estudantis: o tijolo. Entretanto, fugiu do convencional e buscou uma linguagem moderna e diferente de tudo que havia antes, como prova a Planta Baixa mostrada acima.   
  1. Espelho d'água;
  2. Escada de acesso ao subsolo com entrada pela direita do altar;
  3. Altar;
  4. Salão;
  5. Corredor de acesso envidraçado;
  6. Hall de entrada com duas portas de comunicação ao jardim;
  7. Acesso ao andar inferior;
  8. Parede interna ondulada;
  9. Parede externa lisa.
          Nela ainda é possível ver o desenho das cabeças das sapatas que sustentam os pontos dos arcos (impostas) que tocam a estrutura de apoio (a própria sapata). 


          Antes mesmo de se formar em arquitetura, no ano de 1934, pela Universidade de Yale, Saarinen já havia estudado escultura em Paris e certamente iniciou seu aprendizado e inclusão no mundo das artes muito precocemente no seio familiar. Filho de pai arquiteto e mãe escultora e fotógrafa, Eero percebeu desde cedo valores que traria para sua obra futura. Atingida sua maturidade profissional, passou a desenvolver edifícios onde a estrutura tem presença marcante e importância ímpar, fundindo-se aos demais elementos formais da obra, para constituir o todo, como partes iguais. Nessa Capela isso fica bem claro! A estrutura se comporta como parte do desenho final, sem máscaras ou coberturas. A concepção do espaço parte da elaboração e do requinte das formas construtivas.

          Com uma escala humana agradável e sem o historicismo fake dos prédios circunvizinhos, A Kresge Chapel representou uma resposta modernista ao tradicional recorrente na cultura acadêmica da época. Apropriado para um Instituto de Tecnologia e conectado aos avanços estéticos de seus contemporâneos mais famosos o desenho de Saarinen foi elevado à categoria de clássico da arquitetura mundial. 

           A Capela é quase perfeita! Só não entendo por que a peça que sustenta o sino não foi elaborada pelo próprio arquiteto, já que tinha formação em artes. Vale lembrar que desempenhou um papel muito importante na história do design mundial com suas cadeiras e mesas Tulipa. Sua desenvoltura e originalidade no desenho de mobiliário lhe valeu dois prêmios antes mesmo de lançar estes móveis tão famosos.

         O elemento escultórico fixado na laje de cobertura descentralizado e  bem próximo ao limite do prédio funciona como torre sineira. Alta, metálica e repetindo as linhas dos arcos da base do prédio é de autoria do pintor e escultor americano nascido na Polônia, Theodore Roszak (Não confundir com o historiador que possui o mesmo nome). Foi adicionada posteriormente, ainda na década de cinqüenta. Eu particularmente acho essa torre mais que feia: medonha! Não chega a estragar a fachada, mas por pouco! Ainda bem que as paredes de quase dez metros de altura chamam tanto a atenção que a torre pode até desaparecer misturada ao fundo. Isso porque (ainda bem) é uma estrutura de linhas bem leves e nada agressivas. Mas continua feia pobrezinha! De alumínio fosco ergue-se na linha do altar entre a beirada da Capela e seu óculo.


 
          O pequeno arco pleno, ladeado pelos dois maiores, marca a exata posição do altar. Estes arcos dão brilho à fachada que conta com outros abatidos e bem sombreados que sustentam a parede externa. O mais interessante de todos os detalhes dessa construção é justamente a existência de duas paredes paralelas, onde a interna ganha uma sutil ondulação para dar movimento ao que seria uma simples parede curva e ao mesmo tempo absorve problemas de reflexão sonora. Essas paredes não tocam o chão e permitem a entrada de luz refletida pelo lago que avança por baixo da estrutura até encontrar a laje do piso e uma terceira agora mais baixa que funciona como guarda-corpo (vista em outras fotos revestida com lambris de madeira). 

         Voltando à fachada, vemos ainda a parede lisa e de cor mais clara que veda os tímpanos dos três arcos principais. Essa é desprovida da linha de vidro que existe nos arcos com menor flecha e por isso impede a entrada de luz e dos reflexos da água ao interior. Fica atrás do altar e da escada que desce rumo ao subsolo. Seu objetivo passa a ser conceder um eixo à edificação cilíndrica e orientar o verdadeiro sentido da circulação interna e informar ao exterior seu correto lay-out. Desse modo, quem passa pelo lado de fora é capaz de saber onde fica a mesa cerimonial, o óculo superior e o órgão.


          Nessa imagem é fácil notar a diferença na profundidade das paredes lisas em relação à pele de tijolos. Nos arcos plenos ela aparece bem mais à frente do que no arco abatido ao lado. Apesar da sombra existente, fica fácil perceber essa alteração na cota. O lago, portanto, avança mais fundo nesses arcos abatidos e dele partem reflexos da luz solar para dentro do ambiente que entram através da linha de vidro entre a parede ondulada e o guarda-corpo.


        Um corte mostrando as duas paredes e o guarda-corpo. Notar o trabalho vazado dos tijolos na pele interna. Esses furos entre os tijolos servem também para difundir o som que por eles entra e é levado pela curvatura do edifício ao outro lado do recinto, nesse tipo de tubulação, limitada pela laje que aparece a meia altura entre as duas principais paredes e por um anteparo liso e mais refletente ao som. Engenhoca!!! Coisa de gênio mesmo! Mas será que funciona? Não tenho muita referência nesse sentido. Mas que é original é, resta saber se além de bem bolado o esquema valeu todo o esforço. No desenho aparecem ainda as sapatas,  o modo de assentamento dos tijolos, o lago e sua fina laje, a parede de fundo do lago, a altura do contrapiso interno, a parede do andar inferior e  a linha de vidro por onde se vê a água. Essa parte do projeto é sensacional! 


          Os arcos ganham uma moldura de acabamento que passa a ser o único detalhe decorativo da fachada. A sombra com formato irregular denuncia uma pequena inclinação entre a parede do tímpano e o intradorso do arco. A pequena mureta entre o passeio e o fosso é algo exagerado e não deveria existir a menos que o gramado acabasse ali. Pelo menos serve para sentar e tirar uma bela foto! (risos) Mas não combina com todo o requinte mostrado anteriormente. O que salva é o fato de sumir a mediada em que a distância à Capela aumenta. Mas com tanta coisa eu fui  invocar logo com a a muretinha! (risos)

 
          Mas essa  muretinha que circula a lâmina de água acaba se tornando, mesmo, um elemento de mau gosto que, ao meu ver, acaba com o requinte e a sutileza do projeto. É amador demais e chama muito a atenção. Posso ser demasiado exagerado nessa minha crítica, mas realmente detesto a inclusão de um elemento que seja dispensável, ainda mais quando causa um desconforto visual e deprecia a obra. Se, como falei anteriormente, esse pequeno obstáculo de concreto tivesse a função de barrar a cobertura vegetal, tudo bem, mas como o passeio público já separa o gramado do fosso ela se torna obsoleta. Mesmo que a sua existência tenha razões de segurança em virtude do fluxo constante de ciclistas ou ainda pela precipitação de neve no inverno, ela poderia ser tratada de outra forma. 
             

          As paredes de tijolos vermelhos seguem a tradição das construções locais, diferenciando-se pelo fato de incluir em sua confecção peças salientes, disformes ou quebradas. Esse recurso garantiria uma textura mais rugosa e menos óbvia, ao gosto do arquiteto. De fato é um belo detalhe, ainda que pareça ao observador comum um defeito imposto pelos anos. Eu particularmente gosto desse "quebrado" que torna a parede mais viva, mas há que entender que ao olho menos técnico e mais ordinário esse detalhe pode ser entendido de maneira equivocada e parecer que os tijolos sofreram danos posteriores.


          A entrada à Capela é feita por duas portas colocadas viz à viz, no início de uma passarela coberta e vedada por estruturas metálicas e vidro em ambas as laterais. Esse túnel encontra, à direita de quem entra, uma circulação vertical (escada) que leva ao subsolo e do outro lado uma grande porta que dá acesso direto ao corpo principal. A diferença de altura (pé-direito) entre os dois recintos é enorme (como se vê por fora). O corredor é bem baixinho e o espaço aberto de formato cilíndrico, com cerca de 15 m. (quinze metros) de diâmetro, tem um teto muito mais alto. Infelizmente o acesso ao andar de baixo estava proibido e não foi possível a mim visitar a sacristia e os outros aposentos no subsolo.          

        Visível na fotografia de cima, um detalhe que considero muito bonito é a parte em que a água passa por baixo desse corredor sem ser interceptada e mantendo a total circunferência do fosso raso. Pelo menos essa deveria ter sido a ideia original. As peças que estão abaixo da passarela devem ter sido colocadas posteriormente e deveriam ser retiradas imediatamente. Outra coisa que acredito possa ser diferente é a altura da lâmina de água. Atualmente muito baixa ela deveria ser cheia até atingir o início do triângulo rosado da sapata, cobrindo toda a superfície de concreto. O revestimento do lago também deixa muito a desejar.

         Outro detalhe de grande beleza é a cor da porta. Quente e iluminada! Com apenas uma única folha bem moderna, tira partido de suas linhas simples e puras para obter grande efeito visual com sua tonalidade. Lisa tanto por dentro como por fora, portanto livre de qualquer elemento decorativo, seu destaque recai em sua cor amarelada. O problema é que abre para fora e não recebe nenhuma proteção.

          Outro detalhe que enriquece o design é a característica de seus vidros. Eles possuem uma textura de garrafa com nuances esverdeadas que nubla o exterior e remete àqueles das janelas medievais. Vidros são importantes na história dos prédios religiosos e Saarinen compensa a falta de janelas com esse corredor. Essas placas translúcidas, que criam um desenho desencontrado, dão à circulação uma sensação de privacidade e acolhimento, sem contudo eliminar o mundo externo por causa da abundante luminosidade. Diferente da Capela que, introspectiva, rompe quase que totalmente com o mundo à sua volta.
          Todo esse encanto concedido ao corredor do lado de dentro pouco tem a ver com seu lado de fora. A grandeza de relações que ganha não corresponde ao efeito externo. Interessante porque por fora parece mesmo que não faz parte do projeto, tendo sido construído em um tempo futuro. Mas depois que se entra a ficha cai! E... como cai! É quase um "Ohhhhh"! Nessa hora percebe-se que aquele corpo coadjuvante pelo lado de fora merece mesmo um Óscar! Um Pritzker, para ser coerente!
          
          O canteiro retangular nos dois lados da entrada faz parte do projeto, mas essa vegetação é sacanagem! E a sujeira e o estado do fundo do lago? Nem parece que está em um país rico...


Mais de perto... como fica bonita sem aparecer a a torre do sino! Nada em seu topo seria melhor...
O corredor envidraçado não parece fazer parte do projeto original! 



          Do outro lado a fachada mais sombreada. O volume de vidro encontra um grande arco que marca o portal interno. Dois pequeninos arcos (na foto só se vê um) emolduram a passarela e arrematam os outros mais abatidos. 
          A diferença na altura pode ser vista por fora e sentida por dentro. O teto do corredor bem baixinho ganha detalhes em madeira. Os vidros distorcem as imagens externas e criam internamente um padrão uniforme. O desenho do caixilho é bem da época!

          Tira essa mesinha daí! Eu gostaria de ver um teto mais liso para brincar com o paralelismo. Parede contra parede e teto contra o piso. Esses quadros de madeira fixados abaixo da laje são bonitos e aquecem o ambiente ,além de absorverem o som, mas gosto da coisa do diálogo entre opostos, de espelhar e formar pares! Sem eles aumentaria a sensação de profundidade e concentraria mais o foco no altar.


          O corredor visto desde as portas de entrada, em direção à porta dupla da Capela com o altar ao fundo. Esse corredor cria uma ante-câmara que cerimonializa a relação e impõe respeito. Além de servir como elo entre o público e o semi-público incorporando a ideia de hall de entrada e circulação de acesso, ele alonga o caminho de quem entra e continua o trajeto (ao centro do ambiente) por entre as cadeiras, dando a impressão de um corpo de nave, perdida no partido redondo.


          Com as portas abertas o altar fica à vista de quem imediatamente entra no túnel envidraçado, como se fosse mesmo um único ambiente. Veja que não há diferença no piso que se mantém limpo e claro por todos os cantos. O teto baixo e as paredes muito próximas preparam a pessoa para o grande espaço que vem à frente. Quando fechadas essas portas eliminam toda a interferência do exterior, tanto sonora como luminosa, tornando o recinto muito escuro e completamente separado do mundo exterior. Esse é o propósito desta obra, que não possui nenhuma janela, permitindo a entrada de luz apenas pela claraboia acima do retábulo de mármore e pelos sutis reflexos da água nas paredes onduladas.


          Ao entrar, o olhar fita imediatamente a inacreditável cascata de placas de metal dourado, concebida por Harry Bertoia. Ele não poderia ter sido mais feliz ao criar esse pano de fundo para o alvo monolito de pedra. É uma das peças de arte decorativa mais belas que já vi e sem a menor sombra de dúvidas a mais bem colocada. O efeito é sublime e totalmente adequado ao tema. Muito bem composta e totalmente integrada ao o conjunto. A obra de arte é linda e interpreta a tônica do projeto arquitetônico, repetindo sua simplicidade e obtendo um efeito colossal.
          Nenhuma estátua, nenhuma imagem, nenhuma citação, nenhum símbolo religioso. Nada! Somente a obra de Bertoia e os trabalhos de tijolos nas paredes onduladas decoram o ambiente.
                    

          Um vitral colorido e temático aqui seria impensável! A superfície lisa do material de vedação desse fechamento, com seu efeito translúcido e sua cor branca, vira uma fonte de luz potente e que dá mais força à cascata que do óculo despenca! A imagem que passa, é que bênçãos dos céus estão caindo sobre o altar! É lindo! Eu repito!
           O rebaixamento do teto é mais alto junto às paredes e vai perdendo altura e descendo inclinado rumo ao anel circundante da zenital. É propositadamente pintado com uma tinta escura. Ninguém lembra de olhar para cima! Muito interessante. O foco é sempre a claraboia e o altar! Fantástico! Exemplo de como a arquitetura pode induzir o comportamento. 


A escada de acesso ao subsolo por trás do altar.


          Poucos materiais de acabamento e muita riqueza de detalhes! Essa é uma boa arquitetura! Comparada à uma peça de alfaiataria onde o corte exato e caprichoso vale muito mais que o excesso de bordados e detalhes essa obra opta pelo conceito bem executado e prima pela exclusão dos enfeites exagerados, maneirismos e virtuosismo decorativo. 
            O piso liso, as paredes de tijolos e a meia parede de lambris de madeira dialogam perfeitamente. O altar em pequeno patamar circular de três degraus repete o formato do prédio e fica rigorosamente abaixo da claraboia translúcida e monocromática. 



Meia parede de lambris, guarda corpo de madeira, quadros de tijolos desenhados.

A linha de vidro entre a parede independente e a estrutura interna.


O sutil efeito da luz refletida pela água. 


Muitas ondulações que não ofuscam a simetria!

O órgão marcando a porta de acesso.
                 

          Acima da porta de entrada o órgão sobre o balcão. As leves cadeiras de madeira e assento de palha também conferem leveza e modernidade além de garantirem maior conforto. A iluminação pontual no teto acentua o efeito das paredes orgânicas e dão dinâmica ao padrão dos tijolos. 


          Na fotografia de cima aparece no canto direito inferior (em segundo plano) o tratamento diferente dado à colocação dos tijolos. A maneira diferenciada no assentamento das peças cria quadros perfurados. Essa parte vazada com buracos retangulares serve para permitir uma circulação de ar (cujo movimento refresca o interior) e compensa a absorção sonora dos tijolos. Esses pequenos vãos se abrem para o oco criado entre o gordo das paredes onduladas (internas) e a parede circular (e uniforme) externa. As ondulações internas trabalham de forma acústica para impedir uma aleatória reverberação do som para todos os lados, bem como a textura dos tijolos. As madeiras das paredes restantes também colabora para diminuir a inadequada reflexão dessas ondas sonoras. 

Auditório Kresge

                     Auditório Kresge                                                MIT Chapel

          Desenhado também pelo Saarinen, esse auditório, que do mesmo modo que a Capela, leva o nome de seu patrocinador, foi concebido como uma casca de concreto apoiada em apenas três pontos. A cúpula é cortada em três faces idênticas que criam um arco abatido fechado inteiramente por uma cortina de vidro que cai diretamente ao chão. Moderníssima para a época a cúpula era considerada muito fina e leve e foi executada em concreto armado cobrindo uma área triangular. O seu material de vedação acabou sendo um problema ao longo dos anos e foi trocado algumas vezes. Atualmente o revestimento da cobertura é de placas de cobre. esse material não obedece ao projeto que previa a fixação de placas de mármore, vetadas por causa do seu alto custo. Folhas de calcário muito finas foram colocadas para tentar garantir a aparência clara e lisa idealizada por Saarinen para esse telhado, mas apresentaram problemas técnicos e foram trocadas por chumbo que também não se mostrou adequado. Por fim em 1979 o telhado foi refeito e permanece igual até hoje.

        Com desenho muito puro e linhas bem suaves, ainda parece muito atual, diferente da Capela que já é bem datada. O desenho do auditório parece ser capaz de vencer o tempo e ficar sempre na moda. Sua cobertura e suas paredes de vidro não cansam. Seu formato tem linguagem universal e atemporal.


          Nesse projeto o espírito inventivo do autor aflora e trata o edifício como uma escultura. Suas linhas muito inovadoras para a época, ilustram a vontade de plantar no Campus uma linguagem arquitetônica diferente, provocativa e corajosa imbuída do sentido de progresso com uma filosofia vanguardista, em outras palavras, construir algo diferente dos edifícios tradicionais elaborados sob a ótica tradicionalista e  tutelados por linhas, proporções e esquemas clássicos.
            Muito combatido na época, esse domo ao rés do chão, passou a ser considerado com o passar do tempo uma das estruturas mais belas de toda a Cambridge.
            Também concordo que é muito bonito, Só sinto falta de uma entrada mais formal e bem marcada. A acanhada porta que se mostra apenas pela quebra do ritmo das esquadrias poderia ser mais trabalhada e ter uma fácil identificação. É chato ficar dando voltas em um prédio procurando por onde entrar! (risos). Nesse ponto a quebra com as normas clássicas poderia ser mais branda.


          Pode parecer exagero mas, esse original auditório junto com a Capela Kresge, separados pelo espaçoso gramado conhecido como Kresge Oval, são considerados um dos melhores conjuntos de arquitetura norte-americana dos meados do século vinte. Eu particularmente não os vejo como complementares. Não acho nenhuma relação entre eles, além de servirem à mesma instituição de ensino e de terem sido pagos pelo mesmo mecenas. Penso mesmo que um nega o outro e que não há nenhum elemento formal ou decorativo que indique que formem um conjunto ou lhes promova um elo de ligação. Suas estruturas são completamente diferentes e suas implantações obedecem mais ao urbanismo da área do que uma correlação entre prédios. Assim, ao meu ver, não existe absolutamente nada que diga que formem um conjunto ou que pelo menos tentem dialogar. Ainda bem que existe esse tal gramado que os distancia. Todavia, juntos ou separados (não importa) os dois são belíssimos exemplos de arquitetura.


          Abaixo um desenho de parte do Campus do MIT, com a capela e o auditório. Infelizmente a Capela não é assim aberta para a rua. Bom se fosse, mas no local onde está desenhado um retângulo com vegetação de médio porte, existe hoje um edifício. Dessa forma entre a rua e a Capela foi construído um obstáculo que tapou totalmente a vista do pequeno e belo templo. 

  1. MIT CHAPEL
  2. KRESGE AUDITORIUM
  3. BAKER HOUSE DORMITORY/ Alvar Aalto.