domingo, 9 de setembro de 2012

Robie House - Chicago.

              
             Considerada como um dos mais importantes exemplares da obra de Frank Lloyd Wright, a casa de número 5757 da South Woodlawn Avenue, no bairo de Hyde Park em Chicago, Illinois, bem ao lado do Campus da Universidade de Chicago é também um dos mais importantes edifícios dos Estados Unidos da América.
                    Projetada e construída a pedido do industrial e engenheiro Frederick Robie (fabricante de bicicletas) para ser sua residência, acabou sendo o melhor exemplo da fase do arquiteto conhecida como a das casas de pradaria (Prairie School). Este estilo é atualmente considerado a primeira manifestação genuinamente norte-americana na história da arquitetura. A obra foi terminada e entregue a seus proprietários em 1909. Vale lembrar que no período compreendido entre 1900 e 1910 foram entregues pelo arquiteto cerca de trintas obras desse mesmo estilo, mas que não obtiveram o enorme destaque e interesse que recai sobre a Robie House. 

             Tal fama não acontece por acaso; isso porque nessa obra estão presentes todos os pressupostos da arquitetura orgânica, ou organicista, que foram desenvolvidos a partir dos estudos de Frank Lloyd Wright e ganharam o mundo. Para Lloyd a casa era uma "máquina de viver" e assim sendo deveria responder pelos anseios do seu morador para qual ela deveria ser criada. Dessa maneira o espaço edificado atenderia, obrigatoriamente, às vontades de seu proprietário. Até aí nenhuma novidade, não fosse o fato de o momento histórico permitir uma reviravolta no modo de entender e propor a arquitetura. A escola organicista nega e contrapõe as linhas racionalistas predominantes então e importadas da Europa. É nesse momento que a arquitetura passa a ter, nos Estados Unidos da América, um compromisso maior com sua cidade, seu país e sua cultura. Para FLW o arquiteto deveria entender todo o processo evolutivo cultural a sua volta e a partir do seu trabalho "moldar" o futuro cidadão, por meio de seus espaços de convivência. É, portanto, nesse momento histórico, que nascem as primeiras linhas totalmente independentes da influência do "Velho Continente".
                Para Wright, os ideais desse novo estilo, refutavam as regras impostas tão somente pela estética e pelo gosto particular, levando em conta, principalmente a escala humana e o caráter do homem em relação ao seu meio ambiente. Tal forma de encarar a arquitetura, passa a nortear a obra do famoso arquiteto e eleva seus projetos ao patamar de ícones. 
               A essa altura Lloyd já era capaz de impor aos seus clientes todas as suas vontades e pontos de vista, mas o sucesso e notoriedade alcançados pela Robie House, entretanto, devem-se ao próprio Frederick que encomendou ao arquiteto uma casa com características próprias, tais como: que fosse uma casa à prova de incêndios; que restasse livre dos adereços e elementos decorativos habituais; que não fosse constituída por pobres volumes quadrados como "caixas" e que não tivesse ambientes muito fechados. Robie queria mesmo uma casa que fosse funcional.



                 Acima um desenho da longilínea fachada principal. O curioso é que a casa tem como endereço a outra rua, cuja face é muito menor. Sua entrada social se dá junto ao muro da propriedade vizinha e é bastante reservada se comparada ao restante da casa que é muito visível das ruas.
               O desenho muito simétrico com o torreão dos dormitórios bem ao centro (terceiro piso), perde um pouco a força graças ao deslocamento da área de serviços para trás. 
               Sua silhueta elegante, cujos telhados com suaves inclinações e longas cumeeiras, somados aos terraços relativamente baixos e aos recuos e avanços das paredes acentuam a horizontalidade volumétrica, passa uma sensação muito agradável. Apesar de ser bastante densa no primeiro piso, com muitos muros maciços e um pé-direito muito baixo (que funde a estrutura ao solo na nítida vontade de parecer que a casa brota do chão), a medida em que os olhos sobem a casa vai fluindo e fragmentando em vitrais multicoloridos, cheios e vazios, beirais em balanço e linhas que conversam em um jogo de horizontais e verticais. A casa fica mais leve a medida que ganha altura. 



Acima a visão da esquina e abaixo a entrada principal da Robie House.


               Bem fundo a entrada social, protegida pelo avanço do terraço do dormitório de hóspedes do segundo pavimento (imediatamente abaixo do grande vaso) e por fim o terraço do dormitório dos filhos. As pessoas passavam por todo o volume da sala de estar antes de chegar à porta de entrada e assim absorviam ainda mais a ideia de uma casa espalhada no terreno. A horizontalidade vivida no dia a dia.
              A textura, dos tijolos aparentes, dominante em toda a obra, bem como todas as janelas vedadas com vitrais, frisos de concreto por todos os lados e uma única cor de madeira são detalhes arquitetônicos que concedem ao conjunto uma unidade exemplar. 


               A parte mais alta (composta pelos três pavimentos) é colada no limite do terreno que faz estrema com o vizinho. Ainda assim a casa permanece solta já que o edifício ao lado manteve um confortável afastamento da casa histórica. Esse afastamento com certeza foi garantido por força de lei, uma vez que a casa é patrimônio nacional. Um detalhe curioso: os hidrantes colocados na parede da casa.

                                            
               A série de janelas da sala de bilhar se repete na outra fachada que é voltada para a rua lateral (visível na fotografia ao fundo do escuro ambiente). A casa é muito simétrica, desde sua implantação até o desenho dos pormenores da maioria de seus ambientes. Essa linha de janelas avança para baixo do alpendre de entrada dando ainda mais leveza e acentuando as linhas horizontais. 
               A colocação dos tijolos à vista, com medidas especiais para esta obra (mais longos e mais finos que o usual da época), prima pela perfeição. Em determinados momentos suas emendas quase desaparecem tamanho o capricho do mestre executor. 


               Materiais a mostra despidos dos tradicionais rebocos e pinturas! Lindo! Sem excessos de coberturas e decorações que escondem a alma do edifício! Isso é que mais me agrada nessa casa. Acredito que muito da força deste projeto está nos diversos tons dos tijolos, provenientes das diversas queimas, que muito agradavam o autor , como também na cor natural do betão (concreto armado) armado. O jogo de tons terrosos que variam na palheta do tijolinho, em contraste com as linhas do concreto aparente e as marcações bem escuras das madeiras em conjunto com o brilho dos vidros amarelos e incolores dão o acabamento de mestre que o elaborado projeto exige. 


               O detalhe do grande vaso que  dá acabamento à grossa parede lateral. Apesar de existirem maciços e áreas muito compactas as paredes em sua maioria são mais leves e cheias de aberturas, criadas como peles mais permeáveis que permitem o total diálogo entre o interior e o exterior. Essa integração é ainda mais sentida nos grandes terraços e varandas distribuídos na casa.
              Agora a exagerada ornamentação dá lugar a paredes mais lisas e os detalhes construtivos passam a ter mais destaque. Os grandes vasos são os poucos objetos que ornam a casa, sem contudo ofuscar e desrespeitar as técnicas e os materiais empregados: a estrutura da casa sobressai.



               A belíssima cobertura em cantiléver que sombreia o terraço do living e que dá imensa leveza à fachada da casa. O alto muro vence a altura do andar inferior e protege o mesmo terraço com suas floreiras. Esse alpendre para qual a sala se volta tem ainda dois acessos, um de cada lado, que o une às circulações externas do imóvel.


               Ângulos diferentes da janela em bico, tal qual uma proa, que aponta para a rua e divide a circulação em dois acessos distintos para dentro da sala de estar. Com desenho muito forte, sugere que a casa tenha sido "esticada" por ambas as "pontas". Lindo detalhe. No chão tijolos de vidro que reforçam o uso da luz natural pelo projetista.
                                 

               A janela em ângulo é de fato um dos pontos altos da sala e dá personalidade ao terraço social voltado para a esquina. Essa janela se repete na sala de jantar no outro extremo do volume, que abriga a área social da casa, assim como a ampla cobertura em balanço. Esse detalhe é um dos mais marcantes de toda a construção e exibe um madeiramento mais encorpado e de tonalidade bastante escura. Para Wright a madeira era (seu material favorito) o elemento mais forte e que mais aproximava o homem da natureza.


               Na fotografia anterior uma das tantas janelas com vitrais. Os desenhos geométricos, muito famosos e incansavelmente reproduzidos, são um dos poucos detalhes que nos remetem aos anos da art nouveau, com ares de Charles Rennie Mackintosh. O desenho elaborado sustenta vidros incolores e amarelos. Nessa casa a palheta de cores e a variedade nos materiais de acabamentos não são muito amplas.


               Os enormes vasos de concreto (desenho herdado de outros projetos) pontuam e dão detalhe ao conjunto. São lindos! Lindas também são as inúmeras janelas perfiladas em linhas que dão brilho. A alternância entre cheios e vazios e os espaços criados pelos grandes beirais são absolutamente fantásticos. A casa é linda de todos os ângulos.


               Muito próxima ao passeio, tem em suas paredes os limites entre o público e o privado. Os muros quase não existem, salvo o modificado muro das garagens: em fotografias mais antigas os muros que hoje escondem o pátio de serviços aparecem bem mais baixos. 


               No último andar visto nessas duas fotografias aparece a grande sacada do dormitório principal; abaixo dele a escada social e a sala de jantar.



               Fileiras de janelas, beirais muito salientes, telhados bastante projetados, longas linhas de concreto e alvenaria de tijolos muito finos, todos em conjunto para prolongar a silhueta e aumentar a horizontalidade da construção. O desenho que busca a maior horizontalidade possível constitui-se na principal característica do estilo das casas de pradaria. 


               Uma casa aberta ao exterior, praticamente sem muros e sem obstáculos visuais entre interior e exterior. Por este motivo o arquiteto vedou todas as janelas com vitrais intricados e com vidros muito pequenos, com o claro objetivo de prejudicar a visão dos observadores a partir da rua. De fora seriam notados apenas os vultos e poucos movimentos dos moradores. Quanto menores os vidros maiores as refrações das janelas. Já para aqueles que estivessem no interior a visão dos espaços externos manteria-se inalterada. Essa intenção de ligar visualmente interiores e exterior é a base da arquitetura defendida por Wright chamada de arquitetura funcionalista orgânica.


               Duas vistas da proximidade com a calçada. Os baixos muros deixam as janelas do térreo totalmente a mostra e a privacidade é dada somente pelos efeitos dos vitrais. O resto da casa tira partido dos desníveis dos cortes e da altura dos demais andares para resguardar a intimidade do lar, entretanto, para quem passa do outro lado da rua ainda é possível perceber muito do que se passa dentro dos ambientes.  


               A arquitetura funcionalista orgânica é baseada na harmonia estabelecida entre o edifício e o seu entorno. A unidade entre o espaço construído e o espaço resultante ao seu redor aliado à sincronia entre forma e função são regras a serem seguidas a risca. Esta casa possui estas características e nos ensina com perfeição as leis estabelecidas por Lloyd. A casa se volta para fora e se envolve com a paisagem.


               Logo acima uma vista do pátio de serviços com acesso às garagens. Essa casa apresenta uma novidade para a época: tanto o arquiteto como seu cliente eram grandes apaixonados e incentivadores do automóvel e justo por isso essa casa foi projetada contendo uma garagem para três automóveis com portas individuais. Na fotografia aparece apenas uma delas. Para esse pátio era voltada a janela em ângulo da sala de jantar sob o amplo espaço dominado pela cobertura em cantiléver. 
                  As faixas de concreto funcionam como divisores claros entre os andares da residência. Acentuam a horizontalidade da obra e dinamizam as paredes monocromáticas. 


              A janela da sala de jantar com seus maravilhosos desenhos e vidros coloridos. Abaixo um detalhe do rasgo no teto da entrada da área de serviços para escoar a água das chuvas e o desgelo da neve. Esse detalhe é muito intrigante e mesmo que pareça estranho causa um efeito de brilho muito bonito. Essas colunas que aparecem são da parede vazada da escada que liga o pátio das garagens com a cozinha.


               O tour feito pelo exterior e interior da casa desaponta, mas nada que impeça sua visita. O visitante tem acesso somente a um dos três pisos da residência, permanecendo por pouco tempo, apenas no pavimento principal onde estão a área social, o dormitório de hóspedes e a cozinha. O restante é fechado. Os dormitórios e parte da área de serviços é de uso restrito ao staff e a garagem foi convertida em loja de recordações e todo o tipo de objetos relacionados com a vida e obra do arquiteto. Chega a ser uma falta de consideração com o visitante e um desrespeito com os estudiosos das áreas afins. A procura é enorme e a entrada à casa é monitorada e dividida em pequenos grupos com saídas a cada meia hora. Apesar da enorme decepção o pouco que se vê já agrada muito. Entrar na casa, sentir seu clima e tentar imaginar como foi seu impacto na sociedade da época é no mínimo muito interessante.


               A casa de fato não é muito grande e sua última restauração não incluiu a reconstituição de seu mobiliário original. Mas assim mesmo toda a estrutura da casa e seus acabamentos e detalhes fixos parecem ter sido criteriosamente refeitos e ou consertados. A sala de bilhar do pavimento térreo estava totalmente desfeita e em processo de nova restauração, portanto fechada para o público, mas visível pelos vidros das aberturas internas. O playroom, serve atualmente de sala de vídeo para o tour e está bastante desfigurado. Na área social os tapetes foram refeitos e seguem o mesmo desenho e cores dos originais e alguns móveis embutidos foram renovados e reinstalados. Quanto aos dormitórios e a vista dos telhados a partir do último piso somente nos livros de arquitetura. 




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